MUTUALIDADE  E  PROPRIEDADE  COLETIVA  PRODUTIVA

Fala-se de Economia Solidária como alternativa às relações econômicas pautadas pela lógica capitalista fundada em juros, salários e aluguéis. Entretanto, poucos reconhecem que a única Economia viável, justa e sustentável do ponto de vista ecológico é justamente aquela que consiga abandonar essas categorias mestras da Economia Política, que são, em si, a expressão máxima da alienação dos fatores da produção. Aluguel = alienação dos recursos naturais (terra, água e energia) = poluição. Salário = mercantilização do trabalho = degenerescência humana. Juro = mercantilização do crédito = inflação.
Se a Economia Solidária evita os juros, salários e aluguéis, aplicando-os somente em casos excepcionais quando estes são pagos por indivíduos para as pessoas coletivas às quais o próprio pagante de aluguel pertença, e, assim, dos aluguéis pagos também se beneficie; pode-se dizer que a Economia Solidária nada mais é do que o velho Mutualismo: a receita espontânea para justa solução pacífica das questões econômicas que se perde na noite dos tempos e que compunha originalmente o triplo programa do movimento socialista: MUTUALISMO ECONÔMICO – FEDERALISMO POLÍTICO – PLURALISMO IDEOLÓGICO; antes da perversão que o desviou para o seu oposto: a planificação dirigista estatal e o centralismo democrático do partido único da vanguarda revolucionária que impõe a ditadura do proletariado.
O combate à mercantilização da terra, do trabalho e do crédito não se dá apenas por questão moral. Ainda que comezinha aos tempos atuais, a alienação dos fatores da produção é inviável em todos os sentidos, sobremaneira no econômico se tomado em longo prazo. Poucos têm consciência das arbitrariedades cometidas pelo Estado moderno para a criação dos mercados de crédito, imobiliário e de trabalho. Alguns até sabem que a propriedade privada da terra foi instaurada no Brasil somente em 1850, na Rússia em 1861 e na França em 1789, e, que o mercado de trabalho se abriu no Brasil entre 1808 e 1888, mas quase ninguém compreende o que Karl Polanyi demonstrou no seu livro A Grande Transformação (1944): que a alienação dos fatores da produção com a mercantilização da terra, do trabalho e do crédito (falsas mercadorias) provoca a perversão geral dos mercados, uma vez que por serem mercadorias fictícias estes recursos naturais alienados (aluguéis), estes recursos humanos alienados (salários) e estes recursos financeiros alienados (juros) tendem para valores mais elevados relativamente às verdadeiras mercadorias (bens e serviços destacáveis do processo produtivo). Gerando assim, em que pese à alta geral nos preços, um constante achatamento do valor das verdadeiras mercadorias, o que é uma equação impossível sob o regime de produção capitalista. Esta é a deletéria, inexorável e quase despercebida LEI DA MENOS VALIA exposta por Pierre Joseph Proudhon no seu A Filosofia da Miséria (1844), o que gerou a polêmica com o livro a Miséria da Filosofia de Karl Marx e o enquadramento do Manifesto de 1848 anatematizando os seguidores de Proudhon. Por sinistras razões, o rebaixamento geral do valor das verdadeiras mercadorias em função das três falsas mercadorias sobrevalorizadas (cancerosas) pagas sob os preços de aluguéis, de salários e de juros foi soberbamente ignorado por aqueles interessados em Economia Política/capitalismo e na crítica marxista da Economia Política/socialismo, justamente porque o Mutualismo põe por terra tanto uma como outra. Em face da MENOS VALIA cada vez mais o patronato precisa extrair mais MAIS VALIA de menos gente empregada, porque o valor das mercadorias tende ao zero, o que é impossível sob o capitalismo, gerando assim o pior dos mundos na insistência em se manter o regime da alienação.
A tendência ao valor zero é a trajetória civilizacional para a consolidação dos valores, rumo à gratuidade universal negociada entre pessoas individuais e coletivas em mercados livres do arbítrio de quaisquer agentes. Tal consolidação do valor (amortização = morto para o mercado) se dá após a constituição do valor (a valoração transpessoal objetiva). Na dialética de Marx só há lugar para tese e antítese, ou seja, para o valor de uso e o de troca; na dialética de Proudhon temos
uma série quaternária: valor de uso, de troca, valor constituído livre do arbítrio subjetivo e valor consolidado ou amortizado (gratuidade).

 

PRÁXIS

É notório o anacronismo da lei positiva em diversos aspectos. Um deles é a persistência no Brasil da proibição na Lei dos Condomínios da propriedade coletiva produtiva, ou seja, que condomínios, enquanto coletividades detentoras da copropriedade, exerçam atos de comércio. A burguesia, triunfante desde a Revolução francesa, teve como prática a desconsideração e mesmo o aniquilamento das pessoas coletivas como unidades de produção e mesmo sujeitos de direitos, tais como as comunas, guildas, e até mesmo, vimos no início do século XX as firmas coletivas serem substituídas pelas sociedades de capitais anônimas ou limitadas. Portanto, frente a este anacronismo legal não há como se restaurar de um só passo a propriedade rural coletiva produtiva no Brasil. Entretanto, existe uma demanda de pessoas de classe média e de hábitos urbanos, desejosas por se associar para uma vida comunitária no campo. Frente às dificuldades práticas impostas à copropriedade produtiva pela lei de viés individualista prosperam a duras penas, bem como perecem comunidades de vida comunal alternativa de índole religiosa ou ideológica, ou então se articulam soluções construídas à margem da lei, baseadas na confiança entre os contratantes (contratos de ‘gaveta’ de cessão irregular da posse) que não raro originam desentendimentos quando da sucessão dos contratantes.
Ainda que a legislação evolua, tal como na redução das formalidades para a constituição de uma cooperativa, como se deu na Lei 12.690/2012, há que se entender que uma cooperativa de produção agrícola que solidariza apenas uma das dimensões da vida comunitária (a produção) não seria a solução suficiente quando se pensa em solidarizar (juntar) poupanças individuais variáveis em um fundo social que venha a incrementar uma mais valia coletiva em prol da coletividade. Nossa proposta se assemelha à solução meio informal, contudo legal, da atual emergência da COOPERATIVA INTEGRAL em Espanha, que estão, na prática, a restaurar a comuna naquele país.
Propomos a constituição de duas coletividades distintas com uma única finalidade estatutária e contratualmente firmada por ambas, duas coletividades com a quase identidade de membros componentes e legalmente constituídas, uma associação de mutualidade com a finalidade precípua de gerir fundos fechados de associados investidores (poupadores) com a finalidade específica e exclusiva de financiar, através do mútuo, determinado empreendimento solidário e a cooperativa de produção autofinanciada, autossustentável e autogerida a ser financiada por este seu respectivo fundo solidário. A finalidade de cada fundo solidário seria reunir os recursos (poupanças individuais, voluntárias e variáveis) que estatutariamente seriam integralmente empregados na capitalização da propriedade coletiva escolhida e pré-determinada (compra e equipagem), que, mediante contrato de promessa de compra e venda, seria colocada na posse da cooperativa, cuja propriedade passaria em mão indivisa somente ao cabo da devolução do mútuo com o ressarcimento dos recursos disponibilizados pelo fundo de mutualidade, o que acarretaria na extinção da pessoa coletiva daquele fundo ou clube fechado de investimento. A princípio a cooperativa teria como capital, além das suas cotas parte constituídas por seus cooperados, apenas o seu fluxo de caixa incrementado pela disposição dos recursos disponibilizados pelo fundo que não poderia investir em outra coisa senão na terra e nas benfeitorias comunais. Ao fim das disposições contratuais, firmadas entre ambas as coletividades, após vários anos de ressarcimento do mútuo com alguns anos de carência, a cooperativa seria proprietária de tudo e o fundo extinguir-se-ia. Sendo sábio, e também recomendado por nossa associação de mutualidade que a própria cooperativa integral disponha em seu estatuto que se extinguirá tão logo receba em seu nome o título da propriedade da terra da mutual financiadora, pois, a sua extinção enquanto pessoa jurídica nada mudará as relações de produção e convivência,
forçando, por sua vez, o Estado a reconhecer a realidade e a legalidade da COMUNA RESTAURADA, enquanto FATO NORMATIVO impondo-se ao reconhecimento do direito positivo.
Ao se adotar estatutária e contratualmente (entre uma coletividade e outra), um valor referencial constituído livremente pactuado entre os mutuantes, que, cedendo crédito se fazem credores, e aceito pelos cooperados, que, acedendo ao crédito, se constituem em devedores, a nossa proposta permite a atualização do valor dos ressarcimentos pagos pela cooperativa ao clube de investimento mutual SEM A INCIDÊNCIA DE JUROS ou de qualquer outro mecanismo governamental, mormente fictício, de correção monetária. No caso, por se tratar de mútuo, não cabe aplicar juros, o que inviabilizaria o negócio, e, ademais, o benefício maior e almejado recebido pelo mutuante é o direito a locupletar-se como cooperado da mais valia coletiva oportunizada pela junção das poupanças individuais. Adotaremos um valor constituído assim como o é o CUB (custo unitário básico da construção civil para a edificação de um metro quadrado de área construída sob as exigências mínimas legais e em nível mediano de acabamento) que livra os contratantes no mercado de imóveis do pagamento de juros. Entretanto, a nossa URV (unidade referencial de valor) será um valor universal e não específico a determinadas categoriais ou ramo de atividade. Aliás, tão universal que é imune às crises cambiais por se tratar de um valor constituído equânime em todas as praças do Planeta Terra.
Assim, a nossa proposta permite a reunião de recursos individuais variáveis, que alguém mutue R$500mil, outro 50mil ou mesmo apenas 5mil, e todos tenham iguais direitos e deveres, tanto como cooperado, quanto como mutuante, pois a diferença restará no valor que receberá de volta, em moeda oficial, em correspondência ao valor investido, em equivalência ao valor constituído escolhido (indexado à URV). Haverá o direito de retirada do fundo, ou mesmo a possibilidade de expulsão do grupo, seja do clube de investidores (fundo), seja da cooperativa. Contudo, tal direito de retirada não é absoluto, mas condicionado aos termos previamente pactuados. O retirante não tem o direito de exigir a pronta devolução daquilo de mutuou. Pode se retirar e esperar a devolução no cronograma contratado ou pode vender a sua participação no fundo para outra pessoa desde que aceita pelo grupo.
É dupla a vantagem em participar como investidor no fundo. Não objetiva ganhar dinheiro, pois não havendo juro não há como se tirar lucro monetário. Mas, sendo a autogestão da própria riqueza (via associação enquanto associado) é o refúgio mais seguro em tempos de altos riscos de colapso do sistema financeiro baseado em bancos, e, ademais, o investidor, não importando a quantia investida e aceita grupalmente no fundo (sempre por deliberação coletiva), terá o privilégio de receber da cooperativa autofinanciada um LOTE EXCLUSIVO DE POSSE perpétuo, inalienável no sentido que somente poderá ser cedido (vendido ou alugado) para quem for admitido pela pessoa coletiva (cooperativa) e transferível a herdeiro designado desde que também seja admitido pela coletividade. Obviamente que, pelo fato de que toda terra a ser libertada do mercado ter uma área limitada, sempre serão limitados os lotes de posse a serem distribuídos entre os investidores de cada fundo.
Cada fundo, enquanto coletivo, será soberano para decidir a sua URV, seus prazos, meta financeira e normas. Bem como soberana será cada cooperativa jungida (ligada em espontânea servidão = contrato) ao seu respectivo fundo solidário. Como gestora dos fundos solidários, que vão operar sob a sua personalidade jurídica (CNPJ), os custos operacionais de cada fundo são de legal responsabilidade da associação mutual. Por razão de equidade, regra basilar do mútuo, recomendamos que a associação somente institua fundo que preveja no seu ato constitutivo (contrato coletivo de adesão da associação com os associados investidores) a fonte própria de recursos para os seus custos operacionais. Recomendamos que o fundo, enquanto grupo solidário, receba quaisquer valores em aportes de mutuantes (investidores) admitidos pelo grupo. Contudo, que o contrato de constituição do fundo preveja o direito a um lote exclusivo de posse
(ou de mais de um lote, a critério de cada fundo) apenas para o investidor que aportar uma quantia mínima, a qual seria retida do montante devido para devolução do mútuo, servindo assim como fonte própria de recursos para a cobertura dos custos operacionais do fundo. Por exemplo: sendo o aporte mínimo de R$10mil, quem aplicar R$100mil no fundo de autofinanciamento de determinada cooperativa receberá um lote de posse na cooperativa mais o retorno de R$90mil atualizados segundo a URV escolhida, quem aportar neste fundo R$20mil receberá um lote de posse e o retorno de R$10mil.
Apesar do nome: RESTAURAR A COMUNA, nosso projeto nada tem de comunista. Trata-se de mutualismo orientado pela tradição ancestral e universal de propriedade comum e posse partilhada, parcialmente comum e parte individual. Cada cooperado investidor com o direito de receber um lote de posse individual perpétuo, inalienável e transferível a sucessor; bem como, sempre no interesse da comuna, serão aceitos cooperados avulsos, não mutuantes, que receberão igualitariamente das sobras da cooperativa, sem direito, contudo, de receber lote de posse frente à impossibilidade prática. A princípio a cooperativa bem capitalizada (sobras incrementadas) deve atrair cooperados avulsos, com a tendência que ao fim da carência as sobras escasseiem provocando o raleio dos avulsos. Restarão, todavia, os cooperados investidores para gerar o faturamento necessário para o ressarcimento deles próprios enquanto mutuantes. O mutuante terá então quatro fontes regulares de renda: a) a remuneração igualitária das horas de trabalho prestadas à cooperativa, nos termos da Lei 12.690/2012 (valor da hora não inferior ao valor do salário mínimo hora), b) a eventual partilha anual das sobras da cooperativa conforme horas-trabalho prestadas à coletividade, c) a devolução, pela associação, do mutuado e d) a produção das suas atividades particulares no seu lote de posse. O cooperado não mutuante apenas duas: a remuneração igualitária das horas de trabalho prestadas à cooperativa e a eventual partilha das sobras da cooperativa.
RESTAURAR A COMUNA RESISTINDO AO ESTADO SEM AFRONTA A SUA LEI. A princípio um fundo de mutualidade e uma cooperativa, pessoas coletivas distintas formadas pela quase identidade de pessoas. Ao fim, o fundo se extingue com a devolução dos mútuos e a cooperativa, pessoa jurídica, se transforma em comuna, pessoa coletiva complexa, que o Estado haverá de reconhecer em seu direito à propriedade coletiva produtiva. Propriedade esta que, sendo comunal, estará amortizada, morta para o mercado imobiliário, impassível de venda ou fracionamento.
 

A RECONSTRUÇÃO DA PROPRIEDADE COLETIVA PRODUTIVA AUTOFINANCIDADA, AUTOSSUSTENTÁVEL E AUTOGERIDA, NA SUA FORMULAÇÃO CLÁSSICA (mutualista) COM A PARTILHA DA POSSE EM COMUM E INDIVIDUALMENTE. EIS O NOSSO CAMINHO PARA A COOPERATIVA INTEGRAL, onde a geração de renda, a moradia integrada ao trabalho e a reconstrução do(s) sujeito(s) ou do Ser (a Cura) se integram. Eis o serviço precípuo (principal) de nossa associação mutual: a primeira Mutualidade formalizada no Brasil.

 

IAÇÃO MUTUAL TERRA COMUM - AMTC

 

 





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